A situação financeira grave por que passa o Botafogo leva a uma inevitável discussão
sobre uma ampla reforma estrutural, que modifique substancialmente o modelo atual
do clube. Reformas pontuais no Estatuto já não servem mais diante da urgência e do
tamanho das mudanças necessárias. Sendo assim, é interessante observar modelos
aplicados com sucesso em outros clubes, cada um ao seu jeito, com maior ou menor
grau de sucesso, conforme suas circunstâncias.

Em 2014, o Botafogo voltou à Libertadores após dezoito anos, e enfrentou por duas vezes um desconhecido clube equatoriano, o Independiente del Valle. Dois anos depois, o del Valle chegou a final da Libertadores, enquanto o Botafogo luta para se manter na série A após voltar da série B.

 

 

O del Valle tornou-se um clube empresa há cerca de dez anos, e isso merece especial
atenção neste momento, uma vez que corre na Câmara dos Deputados o PL
5082/2016 que cria a Sociedade Anônima do Futebol (SAF), inspirada na Sociedade
Anônima Desportiva (SAD) de Portugal.

De Club Social a Companhia Limitada

Fundado em 1958 com o nome de Club Social y Deportivo Independiente, em 1977
passou a se chamar Independiente José Terán, o clube que chega a final da
Libertadores da América foi refundado em 2007, quando uma reforma estatutária
mudou o seu nome para Independiente del Valle (o clube é do vale de Sangolquí).
Michelle Deller, poderoso empresário equatoriano dono de imóveis e dos shopping
centers Quicentro Shopping y San Luis, uniu-se a um time de peso: Franklin Tello,
presidente do KFC no Equador, Santiago Morales, ex-jogador, e Héctor Jácome,
prefeito de Sangolquí. Juntos assumiram a direção do clube e provocaram uma
revolução.

Em janeiro de 2008, com um capital social de apenas 400 dólares, Deller criou a
Companhia Limitada Independiente del Valle, a primeira do futebol equatoriano. Ao
contrário do antigo Club Social y Deportivo Independiente, a companhia poderia

receber investimentos financeiros, ter uma administração profissional, e, futuramente,
participar da Bolsa de Valores.

El Club Especializado de Alto Rendimiento

A segunda grande mudança foi criar um centro de treinamento, ou, como eles
preferem chamar, centro especializado. Com investimento anual superior a 600 mil
dólares, além de alguns milhões investidos na construção, possui 7 campos com
medidas oficiais, uma piscina coberta, ginásio, hotel, academias, refeitórios e uma
escola.

Toda essa estrutura é compartilhada por até 140 jogadores, divididos em 4 categorias,
além da equipe principal. O processo de “peneira” é semanal. Todo sábado, cerca de
30 crianças são observadas, algumas são selecionadas para uma segunda parte do
processo que dura 2 semanas de treinamento intensivo. Ao final, os escolhidos
passam a morar e estudar no próprio local. Recebem uma ajuda de custo que varia de
50 dólares a 150 dólares mensais.

Seu estádio, o acanhado El Estadio Rumiñahui, possui capacidade máxima de 10 mil
pessoas. Em 2014, Botafogo jogou lá pela Libertadores. Perdeu de 2×1 graças as
expulsões de Edilson e Bolívar. Além de pequeno, é feio, mas fica a 2850 metros
acima do mar, o que confere ao clube uma vantagem devido à altitude. Essa
capacidade seria suficiente para a quantidade de torcedores que o clube possui, mas
a partir da segunda fase da Libertadores o mínimo exigido por regulamento passa a
ser de 20 mil torcedores.

Del Valle elegeu, então, o Estádio Olímpico Atahualpa, em Quito, como sua casa.
Mas qual a razão para um time que está há menos de 10 anos na elite equatoriana,
nunca foi campeão e não possui nenhuma grande estrela, lotar um estádio de 38 mil
pessoas numa outra cidade?

Esse aí ao lado é o presidente do del Valle, Franklin Tello, entregando um cheque
superior a um milhão de reais a ONU. Em 16 de abril um terremoto atingiu o equador
matando mais de 600 pessoas e deixando milhares de desabrigados. Ao passar da
fase de grupos, Tello prometeu que toda a renda com bilheteria nos jogos da
Libertadores seria destinada às vítimas da tragédia. Essa atitude cativou torcedores de
todo o país que resolveram abraçar o time e o transformaram no representante do
Equador.

Além da reformulação societária, do belíssimo centro de treinamento e da crescente
torcida, graças em boa parte a campanhas sociais, o clube possui como
patrocinadores grandes empresas multinacionais: KFC, Chevrolet, Gatorade, Directv e
Marathon, além de empresas nacionais que vão desde o Banco Guayaquil até um
restaurante local. São empresas que chegaram ao clube graças à agenda telefônica
de seus diretores. Afinal, o presidente do clube também é o presidente do principal
patrocinador, mas permaneceram graças a um projeto de longo prazo bem executado.

O adversário das finais foi o tradicional Atlético Nacional, que, curiosamente, também é um clube empresa, cujo dono é o bilionário colombiano Carlos Ardila Lülle.  Independiente do resultado, as principais estrelas da equipe foram vendidas após as finais. Mas isso não tira o sono de seus novos torcedores. O projeto, como gosta de dizer Luxemburgo, é para o futuro. Enquanto sua fábrica de jogadores estiver a todo vapor, novos talentos vão surgir e o clube seguirá disputando novas finais.

E o Botafogo, qual é seu projeto pro futuro?

Postagem original do grupo Botafogo Sem Medo

O Botafogo sem Medo é um grupo que tem como objetivo a abertura do Botafogo, além de mais transparência e modernidade na sua administração