Em áudio tornado público há um mês, o ex-presidente do Botafogo, Carlos Augusto Montenegro, falava que a contratação do técnico Alberto Valentim pretendia salvar o Botafogo de consequências catastróficas de um rebaixamento: “Para existir 2020”, resumiu. A declaração pode soar exagerada, mas o temor é justificável. Ao lutar contra a queda, o Botafogo — e também o Fluminense, que soma apenas um ponto a mais que os alvinegros (34 e 33) — tenta evitar não só a provocação dos rivais como também um caos financeiro ainda maior do que o atual.

Um possível rebaixamento impactaria os cofres dos cariocas. Desde a edição atual, quem desce para a Série B vê a cota de TV despencar. Todos os participantes da segundona recebem em torno de R$ 8 milhões. É pouco mais de 10% do que os cerca R$ 60 milhões que os dois clubes receberão este ano caso escapem da divisão de acesso.

Na verdade, o prejuízo já começa em 2019. A cota de TV é dividida em três parcelas: 40% pagos igualmente a todos, 30% que variam de acordo com a quantidade de jogos transmitidos (sem contar o Pay Per View) e outros 30% relativos à classificação final na tabela. Quem termina no Z4 não tem direito a esta última fatia.

Vale lembrar que o televisionamento é a principal fonte de renda da maioria dos clubes. Em 2018, o Botafogo registrou em seu balanço R$ 94,1 milhões com as transmissões. Este valor correspondeu a 49,8% do total de R$ 182,9 milhões arrecadados no ano.

Receita cai, despesa permanece

Como nos últimos anos, o Fluminense fez da venda de atletas uma receita significativa, a cota de TV representa uma fatia um pouco menor do bolo. Mas, ainda assim, trata-se de uma perda importante. O clube das Laranjeiras fechou 2018 com R$ 113,3 milhões recebidos pela transmissão de suas partidas. Equivale a 40,4% do total de 280,5 milhões. E até mesmo a renda com transferências seria afetada com um possível rebaixamento.

— Temos que lembrar que estas são receitas extraordinárias. Num ano de baixa performance, seus ativos não são tão atraentes para o mercado. Aí vêm as perdas indiretas. Porque, fora da elite, você é menos atrativo comercialmente — explica Pedro Daniel, diretor-executivo da Ernst & Young.

Trata-se de uma bola de neve. Outras receitas, como bilheteria, programa de sócio-torcedor e patrocínios, podem ser afetadas pela queda. Um movimento que não se repete da mesma forma nas despesas, já que são clubes com gastos altos e que estão entre os donos das maiores dívidas do futebol brasileiro.

— É importante dizer que os clubes sofrerão essa redução de receitas sem a possibilidade de reduzir despesas, pois a Lei Pelé obriga o pagamento integral dos contratos com os jogadores. O resultado é catastrófico: receitas da Série B com despesas da Série A — alerta Pedro Trengrouse, coordenador acadêmico do curso FGV/Fifa/CIES da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Modelo S/A mantido

Entre os times considerados grandes, quem divide este drama com a dupla carioca é o Cruzeiro, hoje em 16º com os mesmos 34 pontos do Fluminense. De acordo com projeções feitas pelos matemáticos da Escola de Matemática Aplicada da FGV (EMAP), o risco de ao menos um destes três ser rebaixado é de 85%.

O futuro é preocupante. Mas, ao contrário do que disse Montenegro no áudio vazado, 2020 não existe apenas com a permanência na Série A. Principalmente para seu Botafogo, que vive um momento de transição para o modelo S/A. O projeto, que prevê o fim da gestão amadora e a entrada de recursos de investidores, não seria interrompido com o rebaixamento. Ainda que o aporte de dinheiro seja menor do que com a manutenção na elite, significa uma verba nova que não só os alvinegros, como todos os outros clubes, deveriam procurar neste momento.

— O investidor não visa o imediato. Ele quer retorno sobre o investimento no médio prazo — afirma Pedro Daniel. — O Botafogo tem potencial, está numa cidade comercialmente interessante e tem história. São situações atraentes para potenciais investidores.

Matéria do site Extra online

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