2019 do Botafogo já se anunciava dramático desde o início do ano. Parecer do Conselho Fiscal em cima do balanço referente ao exercício de 2018, publicado em abril, destacava déficit na receita bruta do clube e elevação da dívida. Segundo a empresa de marketing esportivo “Sports Value”, do especialista Amir Somoggi, o Alvinegro é o maior devedor do futebol brasileiro: R$ 730 milhões.
Mas o mês de julho tem sido especialmente devastador. Já desgastados com a rotina de atrasos, os jogadores fizeram o segundo protesto no ano e resolveram se calar. Com dois meses, premiações e direitos de imagem em aberto, fecharam-se na ideia de só voltarem a conceder entrevistas após que pelo menos parte do débito seja quitado.
Não há previsão, porém, para o acerto e já existe o temor que, caso se chegue a três meses de salários atrasados, jogadores procurem a Justiça a fim de se desvincularem de forma unilateral.
Dificuldades para a captação de recursos
O quadro de penúria financeira é claro, e o clube, sufocado por penhoras, dívidas trabalhistas e com a União, não consegue recursos para amenizar o clima junto aos atletas nem para pagar funcionários, que não receberam o mês de junho.
A busca por um patrocinador master segue sem sucesso desde fevereiro, quando a Caixa deixou o clube. O Botafogo, aliás, ainda tem a receber da instituição federal, mas na luta para reconquistar as CNDs (certidões negativas de débito) necessárias, tais recursos não entram.
A Kappa, nova fornecedora de material esportivo, só entrará no uniforme em setembro, quando as peças serão lançadas. Com o estoque da Topper, que atualmente estampa sua logomarca na camisa alvinegra, praticamente esgotado, o clube encontra mais um entrave para a obtenção de receitas.
Figuras importantes são convidadas
Acuado, sem respostas e, principalmente, sem o faz-me rir para o elenco, o departamento de futebol do Botafogo, capitaneado por Anderson Barros, tem convidado figuras importantes do clube a se aproximarem do dia a dia dos atletas.
Presidente campeão brasileiro em 1995 e alvinegro que corriqueiramente injeta dinheiro no futebol para amenizar crises, Carlos Augusto Montenegro foi convidado a assistir a um treinamento da equipe nesta semana, mas, devido a compromissos, não pôde comparecer.
Se julho é dramático, agosto promete desgosto
Montenegro, que ajudou a pagar salários recentemente e avalizou a contratação de Diego Souza – o vice de futebol Gustavo Noronha, inclusive, o citou na apresentação do centroavante -, qualifica o cenário atual como desanimador.
“O pior mês do Botafogo será sempre o próximo. Não tem essa de mês de julho ou agosto. Está desanimador”, disse Montenegro, emendando:
– O pessoal todo é bem intencionado, por isso eu ajudo, mas fechados numa redoma. Eles não sabem o que está acontecendo fora. O que os botafoguenses acham. Acham que sabem tudo e resolvem tudo. Teve uma época em que imaginavam que não precisavam de ninguém, agora está batendo desespero.
Montenegro ainda pontua que a composição para a entrada dos irmãos Moreira Salles, tratados pela torcida como salvadores da pátria, foi abordada de maneira morosa no início do processo.
A auditoria contratada pelos Moreira Salles junto à Ernst & Young foi finalizada em julho. É aguardada a volta de Walter ao Brasil, um dos irmãos e atualmente fora do país, para que as conversas ganhem corpo.
Cláudio Good, escocês que foi vice de finanças do clube com Bebeto de Freitas e também outro parceiro em momentos difíceis com aporte financeiro, esteve presente no Nilton Santos na última semana.
Além de levar pessoas que ajudam o Botafogo diante do atual cenário, Anderson Barros também tem convidado para os treinos esportistas com história em General Severiano. Afonsinho esteve com Eduardo Barroca e, nesta quinta-feira, o técnico Sebastião Lazaroni visitará os atletas.
Adiantamentos que comprometem presente e futuro
Se na gestão de Carlos Eduardo Pereira (2015 a 2017) a situação financeira foi mais tranquila, os diversos adiantamentos realizados (principalmente nas cotas de TV) no período deixaram a vida de Nelson Mufarrej, o atual presidente, mais complicada.
Em 2019, ao menos até agora, o Botafogo vem sobrevivendo mês a mês graças às vendas de jogadores (Igor Rabello, Matheus Fernandes, Leandro Carvalho e Glauber), um empréstimo recente – que contou com o percentual de atletas da base como garantia – e a ajuda de botafoguenses ilustres.
Um adiantamento de R$ 40 milhões junto à Globo, obtido em 2015, são descontados em cinco parcelas anuais desde 2016, três de R$ 6 milhões e outras duas de R$ 11 milhões. O parcelamento se encerra em 2020, conforme está previsto no orçamento publicado pelo site oficial do clube.
Um outro adiantamento fez o Botafogo renunciar ao recebimento de R$ 3,3 milhões mensais referentes ao Pay Per View.
Possíveis vendas
Embora tenha iniciado o Brasileiro de forma consistente – é sétimo colocado, com 15 pontos -, o Botafogo sabe da necessidade de se fazer caixa com vendas.
No orçamento alvinegro, há uma projeção para a captação de R$ 40 milhões em vendas de direitos econômicos. Penhoras à parte, o clube tem se aproximado do objetivo.
Foram R$ 15 milhões por 75% dos direitos econômicos de Matheus Fernandes, R$ 13 milhões por 70% de Igor Rabello, R$ 3 milhões por 40% de Leandro Carvalho e R$ 2,5 milhões por 70% de Glauber.
Do atual elenco, Gatito Fernández está bastante valorizado e tem recebido sondagens. Alex Santana, com muitos gols no primeiro semestre, é outro na vitrine. Há uma cláusula de liberação de seis milhões de euros caso chegue uma proposta pelo volante.
Venda que pode acontecer em breve é a do atacante Ezequiel, atualmente emprestado ao Sport. Ele tem proposta do Atlhetico-PR, mas os R$ 4 milhões oferecidos por 50% de seus direitos econômicos são considerados baixos. O Palmeiras monitora o jogador, um dos grandes destaques do Rubro-Negro pernambucano, e tem interesse em contratá-lo. O campeão brasileiro, porém, ainda não fez proposta.
Crise política e chacota
Asfixiado financeiramente e com pouca exposição dos atuais patrocinadores na mídia devido à ausência dos atletas na sala de coletivas, o Botafogo também está rachado politicamente. O grupo “Mais Botafogo”, que conduziu Carlos Eduardo Pereira à presidência e na sequência Nelson Mufarrej, tem acumulado baixas.
CEP, vice geral do clube, foi o primeiro a deixar o grupo por discordâncias. Depois foi a vez de Cristiane Machado, VP social, e posteriormente Anderson Simões, responsável pela pasta estádios. O último, além de sair do MB, entregou a vice-presidência que ocupava.
Notícia negativa que simboliza a crise financeira do Botafogo é referente ao desbloqueio de uma penhora de R$ 2.831.214,28 obtida em primeira instância pela empresa Hefesto Consultoria e Projetos Ltda.
Ao publicar decisão favorável ao Botafogo, o juiz Márcio Alexandre Pacheco da Silva, em seu despacho, informou que na conta do clube havia só R$ 33,22. O fato virou piada nas redes sociais e motivo de revolta para os botafoguenses.
Apoiado em figuras ilustres, com o pires nas mãos e rezando pela entrada dos Moreira Salles, o Botafogo precisa de soluções rápidas para que o bom trabalho de Eduardo Barroca não seja interrompido e que os meses de julho e agosto não sejam só de desgosto.
Matéria do site Globoesportes